Acordei num sítio
escuro e silencioso, quebrada. Surpreendentemente, doía-me mais a traição de
Loki que propriamente o estado em que me encontrava e o facto de poder morrer.
Como é que ele me podia ter feito uma coisa destas? Ele tinha razão, eu fora
uma idiota por ter acreditado nele, apenas durante uns segundos… e esses
segundos foram cruciais para a minha captura, para eu não me conseguir
defender. E a voz dele… estava diferente, quase metálica.
Quis lutar, quis
projetar o meu escudo magnético, mas não consegui. Sentia-me demasiado chocada
e destruída, quebrada, traída. E chorei enquanto dormia, porque as lágrimas
ainda me escorriam pela cara quando acordei. Como eu é que eu pude ser tão
estúpida ao ponto de acreditar que o Deus do Prejuízo, o Deus das Mentiras, pudesse ter mudado? Ele nunca mudaria, essa era a verdade, quer eu quisesse acreditar quer não!
Tateei o chão. Era
duro, frio e parecia ser de cimento. Tinha uma enorme dor de cabeça, mas não
sabia se era física ou psicológica. Não me lembrava de ter batido com a cabeça,
mas também não me lembrava de nada desde que a rede e o fumo me envolveram,
ainda no túnel das flores. Podia ser apenas uma dor de cabeça psicológica
provocada por tudo o que passara e pelo que sentia.
E odiava o facto de
Loki me ter posto assim, me ter armadilhado e me ter feito sentir assim. Ele
não merecia. Eu devia estar a tentar arranjar uma maneira de sair daquele
sítio, mas só conseguia sentir-me deprimida e desesperada. Acima de tudo, só
conseguia pensar em Loki. Maldita a hora em que o conhecera. Não me arrependia
de me ter juntado à S.H.I.EL.D., pois era o meu lar, mas amaldiçoava Fury por
me ter dado a estúpida missão de vigiar Loki. E culpava Thor por me ter
escolhido a mim para ir com ele e Loki a Asgard. Se tivesse ido outra pessoa,
Loki ter-lhes-ia feito o mesmo que me fez a mim ou seria eu o alvo desde o início?
Sabia que Thor nada tinha a ver com o assunto e que nunca faria nem alinharia
numa coisa destas, mas Loki aproveitara-se. E acima de tudo, culpava-me a mim,
por ter caído tão facilmente na esparrela do Deus do Prejuízo.
De repente, ouvi um arrastar
de uma porta metálica e alguém ligou uma tocha. Recuei instantaneamente e a
luz ofuscou-me. Depois os meus olhos habituaram-se à luminosidade e reconheci
uma cela parecida com as da S.H.I.EL.D. Uma figura encapuzada, dos quais só se
viam os lábios carnudos, sorria maquiavelicamente na minha direção. Seria Loki?
Achava que Loki era mais alto, mas podia ser uma ilusão.
-Foi relativamente
fácil capturar alguém de quem falam tão bem – a voz era-me estranha, não
parecia ser a de Loki. Era rude e forte, mas estridente e aguda ao mesmo tempo.
-Onde estou eu? –
perguntei, cerrando os punhos. A criatura riu.
-Num sítio onde
espero que só uma pessoa te consiga encontrar.
-Quem? – questionei,
apesar de já saber a resposta.
Os seus lábios
moveram-se, abrindo-se num sorriso maléfico.
-Loki.
*
Ponto de vista de
Thor
Era noite e eu arranjava
as coisas para resgatar Bridget. Eu e Loki não fazíamos ideia de onde ela podia
estar, mas tínhamos de agir o mais rapidamente possível. Quando me perguntaram sobre
o que Loki queria dizer quando me pedira ajuda, afirmei que era uma coisa entre
irmãos. Os meus pais e os meus amigos respeitaram o meu silêncio, mas ficaram
desconfiados. Depois também perguntaram por Bridget. Respondi que estava no
quarto a descansar e que pedira para não ser incomodada e Loki criara um
holograma dela no seu quarto, mas que seria desmascarado se alguém entrasse no
quarto dela e a tentasse acordar.
Continuava a não
perceber bem o que acontecera. Algo parecia errado, havia ali algo que Loki não
me estava a contar, mas não quis insistir. Não acho que tenha visto Loki alguma
vez assim; esperava que não estivesse só a fingir; mas ele parecia mesmo
deprimido. Era Bridget assim tão importante para ele? Quer dizer, eles não se
suportavam! Não que alguém conseguisse suportar Loki, mas a relação de eles os
dois era diferente… estavam sempre a implicar, mas agora Loki parecia muito
preocupado com ela.
Acabei de arrumar as
minhas coisas e fui ter com Loki à varanda, onde depois decidiríamos o que
fazer. Ele já lá estava, com a cabeça para baixo a ler qualquer coisa.
-Por onde é que
começamos? – perguntei-lhe. Como ele não respondeu, aproximei-me. Ele machucou
o papel que tinha nas mãos com tanta força e raiva que cravou as unhas na pele.
-Loki, que se passa? –
tornei a perguntar.
-Devia ter suspeitado
que era ele – afirmou, a voz cheia de fúria. Franzi o sobrolho.
-Que queres dizer?
Ele virou-se e eu
tive de me conter para não recuar perante a sua expressão esvairada. Estendeu-me
o papel, que agarrei e li.
“Se queres ter a tua querida e preciosa Bridget de
volta, encontra-te comigo no túnel das flores à meia-noite de hoje. Vai
sozinho, Loki, ou nunca a verás outra vez. De certeza que consegues adivinhar
quem eu sou, não? Faz um esforço, Loki, e chegas lá. Estou à tua espera e
repito, vem SOZINHO. K“
-Isto não é um dos
teus truques, pois não? – inquiri, olhando-o nos olhos. A sua expressão, até
para o Deus das Mentiras, parecia ser demasiado sincera para eu insistir e
continuar a duvidar.
-Tu também o
conheces. Klaus – declarou e o choque invadiu-me o corpo. Klaus? Era um asgardiano com quem a família real não se dava propriamente bem. A família dele
era perita em arranjar problemas no reino, mas ele era o pior. A mãe dele
envolvera-se uma vez em discussões com a nossa e Loki atirara-se a Klaus para proteger
a nossa mãe. Eu estava no outro lado do reino quando isto aconteceu e Loki lutara
com Klaus até a sua mãe não aguentar mais e ter morrido de ataque cardíaco
mesmo diante dos olhos deles, ao ver assim o seu filho lutar. Ainda que a culpa
tivesse sido da mãe dele por ter começado a arranjar problemas com a nossa mãe, Klaus nunca perdoara Loki e sempre dissera que se ia vingar. E aí estava a
vingança. Mas porquê a Bridget? Era ela querida e preciosa para Loki?
Relembrei-me de quando encontrara Loki e Bridget num corredor do palácio de
Asgard. Agora que pensava nisso, eles estavam muito perto um do outro…
-Mas como é que ele
conseguiu superar os poderes de Bridget? Superar a tua magia? – interroguei e
depois acrescentei, sem pensar – quer dizer, dizem que o amor nos deixa
impotentes, mas…
-O quê? – perguntou Loki.
-Nada – afirmei –
quando é que partimos? Não falta assim tanto para a meia-noite.
-Não leste o bilhete?
– perguntou Loki – tenho de ir sozinho.
-Estás a brincar? Não
vou deixar que o meu irmão mais novo defronte alguém cujo poder desconhecemos! Já
te julguei morto uma vez, não vou permitir que isso volte a acontecer.
-Eu não mereço essa
preocupação, Thor, e tu sabes isso.
-Eu sei, mas os
sentimentos não se controlam assim tão facilmente, Loki. Vou contigo.
-Não – ripostou ele.
-Sim. Não insistas,
Loki. Eu escondo-me, ele não vai perceber.
-Achas mesmo? Não vai
resultar e ainda acabamos os três mortos. Além disso, fui eu quem provocou
isto, sou eu que tenho de ir – olhou-me nos olhos e quis acreditar que estava
realmente triste – tenho de ir, Thor. Se… se eu não regressar, apenas… -
engoliu em seco e cravou os olhos no chão – apenas esquece que eu existo.
-Isso é impossível.
-Desculpa, Thor,
desculpa mesmo – lançou-me um último olhar e depois desapareceu. Eu estava a
agir como um irresponsável, ao deixar que ele partisse. E se fosse tudo um
plano para ele se esquivar ao julgamento e se aliar novamente com uma raça inimiga?
Ou se fosse verdade, mas ele… mas ele não voltasse porque… nem queria pensar
nisso. Por isso peguei no meu martelo e segui-o.
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